MARCA JEEP FAZ APELO À CONCILIAÇÃO E À TOLERÂNCIA
As marcas podem se manifestar politicamente? No mundo dos negócios, essa sempre foi uma escolha considerada arriscada: ao se posicionarem diante de uma questão polêmica, as empresas podem sempre se indispor com aqueles que defendem opiniões contrárias. Não é de se estranhar que “ficar em cima do muro” tem sido um comportamento empresarial comum. Mas as coisas estão mudando.
Neste último domingo, dia 7/2, a marca de automóveis Jeep fez um manifesto político em horário nobre. Escolheu o “spot” mais caro da publicidade dos Estados Unidos (em um dos intervalos da partida final do futebol americano, chamada Super Bowl) para defender o fim da polarização que dividiu o povo norte-americano (uma realidade que nós, brasileiros, conhecemos muito bem). Estrelado pelo cantor Bruce Springsteen, que nunca havia feito publicidade antes, o comercial, batizado “The middle” (“O meio”), é um apelo à conciliação, à tolerância e ao compromisso comum.
O automóvel Jeep pouco aparece no filme de pouco mais de dois minutos, e quando aparece, nem mesmo é um modelo atual, mas o lendário modelo CJ-5 (que, aliás, foi produzido no Brasil nos anos 1960 e 1970). Um Springsteen maduro, icônico, passeia por paisagens desoladas e distritos urbanos decadentes norte-americanos, enquanto declama, em off, um texto sobre como o “meio”, um lugar equidistante entre “nossa liberdade e nosso medo”, tem sido difícil de se chegar nesses últimos tempos.
Lido na voz reconhecível do velho roqueiro, o manifesto ganha retumbância. “Não é nenhum segredo que o meio tem sido um lugar difícil de chegar ultimamente. Entre o vermelho e o azul. Entre servo e cidadão. Entre nossa liberdade e nosso medo. Mas o medo nunca foi o melhor de quem somos. E quanto à liberdade, não é propriedade apenas de uns poucos afortunados. Pertence a todos nós. Seja você quem for, de onde você for. É o que nos conecta. E precisamos dessa conexão. Precisamos do meio. Só temos que lembrar que o próprio solo em que pisamos é um terreno comum. Então, podemos chegar lá. Podemos chegar ao topo da montanha, pelo deserto. E vamos cruzar essa divisão. Nossa luz sempre encontrou seu caminho na escuridão. E há esperança na estrada à frente.”
A frase final é, literalmente, o slogan da própria Jeep (“the road ahead”, ou “a estrada à frente”). E a assinatura do filme é cristalina em sua mensagem: “To The ReUnited States of America” (Para os Estados ReUnidos da América), que transforma esse manifesto em uma peça que transcende a marca Jeep, que celebra seus 80 anos em 2021.
Criado pela agência Doner, o comercial ecoa os sentimentos de muita gente, não de todos. Como aconteceu com outro comercial de 2014, da marca Chrysler (do mesmo grupo proprietário da Jeep), no qual o cantor Bob Dylan sugeria aos americanos que comprassem carros “made in America”, uma sugestão protecionista que levantou, então, muitas sobrancelhas nos mundos econômico e cultural.
Quanto à pergunta inicial: sim, as marcas podem se posicionar politicamente. É, aliás, o que espera o público de hoje, atento e militante dentro do universo de exposição digital opressiva. Nem sempre, evidentemente, as marcas agradarão a todos. Mas aquelas que atuarem em concordância com seus valores e suas práticas definirão posicionamentos claros e “seus”, em benefício ou prejuízo próprios. Serão, sempre, escolhas que fazem a diferença. Como fez, recentemente, o Magazine Luiza, ao dar preferência aos negros em um processo seletivo. Polêmico sim, mas marcante. Diferencial.
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